Com experiência no trabalho com biocombustíveis, nomes do setor estão otimistas com a iniciativa
O lançamento, na última quinta-feira (14), do projeto de lei que cria o Programa Combustível do Futuro, chamado de “pacote verde”, foi bem recebido pelos diversos setores econômicos que vem atuando mais de perto com os processos de descarbonização, além dos biocombustíveis e outras matrizes energéticas renováveis.
A proposta de elevação dos limites de mistura de etanol e gasolina é uma medida importante no contexto da busca por fontes de energia mais limpas e renováveis. Aumentar a proporção de etanol na gasolina pode ter vários impactos positivos, incluindo a redução das emissões de carbono, o incentivo à produção de biocombustíveis e a diminuição da dependência de combustíveis fósseis.
No entanto, é essencial notar que a proposta em questão parece se concentrar na alteração dos limites máximos e mínimos permitidos para a mistura, o que dá às autoridades a flexibilidade de ajustar a proporção de etanol na gasolina conforme necessário, sem necessariamente impor imediatamente uma elevação da mistura.
Essa abordagem permite uma transição mais gradual e adaptável para uma maior utilização de etanol, levando em consideração fatores como a disponibilidade de etanol no mercado, a infraestrutura de abastecimento e as implicações econômicas.
A decisão final sobre a elevação da mistura de etanol na gasolina provavelmente dependerá de uma análise mais aprofundada e da consulta a especialistas, indústria e órgãos reguladores para garantir que seja feita de maneira segura e eficaz.
A explicação fornecida pelo presidente da Datagro, Plínio Nastari, esclarece que o Projeto de Lei Combustível do Futuro propõe uma alteração na faixa permitida de variação da mistura de etanol anidro na gasolina. Atualmente, essa faixa vai de 18% a 27,5%, e a proposta é que ela seja modificada para variar de 22% a 30%.
No entanto, é importante ressaltar que essa alteração não implica automaticamente em um aumento na mistura de etanol na gasolina. Em vez disso, essa mudança amplia a margem de flexibilidade para que o governo e o setor regulatório possam, eventualmente, tomar a decisão de elevar a mistura.
A decisão final sobre a elevação efetiva da mistura ainda dependerá da aprovação como uma resolução no Conselho Nacional de Política Energética (CNPE). Portanto, o Projeto de Lei fornece a estrutura legal para uma possível elevação da mistura, mas a decisão real de implementar essa elevação será tomada posteriormente, após discussões e aprovações no âmbito do CNPE. Isso permite que o processo seja conduzido com cuidado, considerando os diversos fatores envolvidos.
Substituição da gasolina
Ele destaca que observa a medida de forma positiva, especialmente porque o Brasil ainda está importando um volume significativo de gasolina (mais de 3 bilhões de litros por ano) e a elevação da mistura aumentará a demanda de etanol anidro e, portanto, a substituição de gasolina importada em cerca de 1,3 bilhão de litros por ano.
“Representa uma economia muito grande para o País, um incentivo para adoção de combustível limpo e renovável e redução, obviamente, de emissões veiculares tanto de material particulado, quanto de compostos cancerígenos gerados pelos aromáticos que o etanol substitui”, diz.
Bônus ambiental
O presidente do Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool no Estado de Pernambuco (Sindaçúcar-PE) e presidente executivo da NovaBio (Associação de Produtores de Açúcar, Etanol e Bioenergia), Renato Cunha, também analisa o aumento da faixa de variação de forma positiva.
“Aumenta a banda e aumenta sobretudo, na prática, o fornecimento desse etanol anidro que é um componente que melhora a qualidade da gasolina brasileira, porque traz um bônus ambiental”, disse Renato.
De acordo com Nastari, a principal característica do “pacote verde” é promover a integração de políticas públicas na área de energia e meio ambiente, em particular o Programa Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio), o Programa de Controle de Emissões Veiculares (Proconve) e o Programa de Eficiência no Transporte (Rota 2030).
“Esses três programas estão em andamento, mas existe a necessidade de que eles conversem entre si, sejam coordenados e consistentes entre si”.
O presidente também ressalta a inclusão no Projeto a promoção e o desenvolvimento de ações para a produção de biocombustível a ser utilizado no transporte aéreo e marítimo e a utilização de hidrogênio verde.
“Esses são elementos importantes e é um projeto de muita relevância e que deverá trazer um impacto de desenvolvimento e de investimentos no setor de bioenergia muito significativos”, acrescenta Plínio.
Segundo Renato Cunha, o programa dá uma demonstração para o mundo da transparência e do zelo que os combustíveis terão no Brasil.
“O programa incentiva empregos e estimula rotas tecnológicas cientificamente comprovadas e atualizadas. Tem transparência e também, por objeto, o cumprimento dessas metas que irão favorecer uma justiça climática mais perene, procurando a questão da redução de emissão de gases do efeito estufa”, diz.
A observação de Renato Cunha sobre a importância de o Brasil exercer um protagonismo na área de mobilidade sustentável é muito relevante. De fato, o país tem uma história notável nesse campo, destacando-se desde os dias do Proálcool.
O Programa Nacional do Álcool, ou Proálcool, foi uma iniciativa pioneira do governo brasileiro na década de 1970 para promover a produção e o uso de álcool combustível (etanol) como uma alternativa à gasolina. O programa teve um impacto significativo na redução da dependência de combustíveis fósseis e na mitigação das emissões de gases de efeito estufa, além de estimular a produção de biocombustíveis no Brasil.
Reconhecendo essa história de sucesso, é importante que o Brasil continue a liderar esforços para promover a mobilidade sustentável. Isso pode incluir o incentivo à produção de biocombustíveis, o desenvolvimento de veículos mais eficientes, a expansão da infraestrutura de carregamento para veículos elétricos e a promoção de práticas de transporte público mais limpas e eficientes.
Segurança e transparência
“O Brasil dá uma demonstração importantíssima, assegurando os investimentos internos e externos que possam vir dessa iniciativa, em uma forma mais segura e com mais transparência. Hoje, o empresário procura investir, mas tem que ter segurança. Ele procura investir em programas que tenham começo, meio e fim”, acrescenta.
A perspectiva de João Irineu Medeiros, vice-presidente de Assuntos Regulatórios da Stellantis para a América do Sul, ressalta a amplitude e a abrangência do “pacote verde” proposto. Sua observação de que o pacote contempla todos os modais de transporte existentes no Brasil é crucial, uma vez que a mobilidade sustentável deve considerar todas as formas de transporte, desde veículos de uso pessoal até o transporte público e a aviação.
Ao adotar uma abordagem abrangente, o governo e as partes interessadas estão reconhecendo a complexidade da mobilidade e a necessidade de abordar uma variedade de desafios relacionados à sustentabilidade e às mudanças climáticas. Isso inclui a promoção de veículos mais limpos e eficientes, o desenvolvimento de infraestrutura de carregamento para veículos elétricos, o incentivo ao transporte público e à mobilidade ativa, bem como a busca por alternativas de combustíveis mais limpos na aviação.
“O programa aborda a importância da descarbonização de forma objetiva, a partir da matriz sustentável que o Brasil já detém”, ressaltou Medeiros.
A divisão de responsabilidades e o planejamento de curto, médio e longo prazo são elementos-chave para garantir o sucesso de qualquer projeto de transição para uma matriz energética mais limpa e de baixo carbono. É positivo que o “pacote verde” leve em consideração a necessidade de uma transição gradual e cuidadosamente planejada, uma vez que uma mudança brusca poderia ter impactos adversos na economia e na sociedade.
A observação de João Irineu Medeiros sobre o Brasil já possuir 50% de sua matriz energética composta por fontes de baixo carbono é uma vantagem significativa. Isso demonstra que o país já está em um caminho positivo em direção à sustentabilidade energética. A diversificação e a expansão das fontes de energia limpa, como a energia hidrelétrica, a eólica e a solar, podem contribuir ainda mais para a redução das emissões de carbono.